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Debate promovido pela CNI analisa o desenvolvimento social no Brasil
Esse é o terceiro de uma série de cinco seminários sobre avanços do Brasil desde 1822 e as perspectivas para as próximas décadas, em diversas áreas, em comemoração ao Bicentenário da Independência
A Confederação Nacional da Indústria (CNI) realizou, nesta quarta-feira (4), o seminário Desenvolvimento Social, que faz parte do ciclo de debates sobre os 200 Anos de Independência – A indústria e o futuro do Brasil. O fórum reuniu especialistas para refletir sobre os avanços ocorridos no país nessa área e o que é necessário ser feito para garantir a igualdade social para as próximas décadas. Na avaliação dos quatro especialistas que participaram do debate, o Brasil precisa ter uma estratégia, com políticas sociais de longo prazo, que atendam as realidades locais, com atenção para os fatores sociais e dando prioridade para a redução das desigualdades e para a agenda da inclusão.
O debate contou com a participação da historiadora Lília
Schwarcz, professora da Universidade de São Paulo (USP) e da Princeton
University, nos Estados Unidos; Ricardo Paes de Barros, doutor em economia pela
Universidade de Chicago e professor do Insper; Neca Setúbal, socióloga e
presidente da Fundação Tide Setúbal; e Celso Athaíde, ativista social, fundador
da Central Única das Favelas (CUFA) e CEO da Favela Holding.
Sobre a escolha do tema do seminário, o presidente da CNI,
Robson Braga de Andrade, afirma que a prosperidade do país não depende apenas
de estabilidade política ou econômica, mas do bem-estar social, proporcionado
pelo acesso a direitos universais básicos, como alimentação, saúde, educação,
trabalho e habitação. “O Brasil deve redobrar os esforços para reduzir a
pobreza e o profundo desequilíbrio na distribuição de renda, que comprometem a
qualidade de vida da população e dificultam o crescimento econômico”, afirma.
Importância da participação de jovens no debate político
Para dar início ao seminário, Lília Schwarcz fez uma
reflexão sobre o que o ano de 2022 vai exigir de todos os brasileiros em uma
análise sobre o cenário político. Ela destacou o marco de 10 anos de
implementação da política de cotas para as universidades e falou da importância
de se atentar para a necessidade de criação de novas políticas que promovam a
inclusão, nos próximos anos. Para a historiadora, no entanto, o mundo vive
momentos de crises e retrocessos civilizatórios, de crise moral e momentos de
grande decepção.
“Me refiro ao fato, de em um ano que será marcado pelas
eleições, tantos jovens não se enxergarem nesse processo. Esses jovens estão
esquecendo que a política é a arte de defender seus direitos e dos outros”,
destacou Lilia. “Ainda é hora de contar com a cidadania, projetar o futuro e
explorar o que temos pela frente, fazendo um exercício de reflexão do passado e
uma inflexão sobre o presente, para sim pensar no futuro do país”, acrescentou.
Medidas estruturantes são necessárias para o desenvolvimento
social
Para a Neca Setúbal, o país avançou em várias áreas ao
longo dos 200 anos de Independência, mas precisa desatar algumas amarras que
inviabilizam o desenvolvimento social. “A primeira delas é o patrimonialismo,
em que alguns setores se apropriam do Estado para obter vantagens”, destacou.
A socióloga pontuou que houve avanços no enfrentamento ao
racismo estrutural no país, a partir de políticas públicas inclusivas, como a
criação de cotas raciais para o ingresso em universidades. Observou, no entanto,
que o Brasil precisa deixar de ser uma sociedade machista, outro fator que, na
visão dela, é um empecilho para avanços na área social.
De acordo com Neca, o aumento da pobreza e da extrema
pobreza, ocorrido nos últimos anos, representa um grande retrocesso do Brasil
nessa área. “É trágico o declínio que sofremos em relação à educação,
especialmente ao longo da pandemia, quando ocorreu uma enorme queda nos
investimentos no setor. O número de matrículas atual é significativamente menor
que em anos anteriores”, destacou.
Neca Setúbal defendeu, ainda, um olhar mais atento às
favelas. “A gente pode ter políticas universais amplas. É preciso mapear quais
são aquelas reais necessidades e as potências de cada comunidade. Os desafios
exigem de forma muito concreta as parcerias”, ressaltou.
Como mensagem final, a socióloga alertou que o Brasil
precisa fazer uma reflexão e terminar com o pensamento predominante do que
chamou de “curto-prazismo”. Na sua visão, é necessário que hajam políticas
públicas estruturantes para construir um país mais justo, diverso e produtivo.
“Se tudo continuar como está, não vai acontecer nada. As empresas precisam
entender que o avanço social é importante para elas e para o desenvolvimento do
país como um todo”, enfatizou.
A importância da atenção às favelas para o desenvolvimento
social
Em suas intervenções no debate, o ativista social Celso
Athaíde, fundador da Central Única das Favelas (CUFA) e CEO da Favela Holding,
destacou a importância das cotas raciais e de políticas inclusivas para o
desenvolvimento social do país. Ele lembrou, porém, que o país enfrenta um
momento de grande exclusão. “Hoje se discute no Brasil o fim dessa
possibilidade que fez com que muitas pessoas avançassem”, lamentou,
referindo-se às ameaças sobre a política de cotas.
Na sua avaliação, o desenvolvimento social do país está
completamente atrelado ao avanço socioeconômico das favelas. “A gente pode ter
um país que cresce e se desenvolve, mas se as favelas, que abrigam cerca
de 17 milhões de pessoas, não se
desenvolverem, nós só teremos aumentado a distância e a desigualmente social no
país”, alertou. “A Rocinha e Heliópolis, por exemplo, são favelas maiores que
83% das cidades do país. A gente precisa olhar para esses territórios e para a
realidade deles para que possamos encontrar soluções”, exemplificou o fundador
da CUFA.
Celso Athaíde ressaltou também a importância da parceria da
CUFA com empresas e fundações, durante a pandemia, para a ajuda às favelas. “As
empresas e empreendedores ajudaram muito a viabilizar junto à CUFA para que
pudéssemos entregar (doações e recursos) nesses territórios”, disse. “Mas temos
um desafio pós-pandemia. A pior crise que uma sociedade pode ter não é uma
pandemia, mas a falta de perspectiva. Quando olharmos para frente, para trás e
para o lado e não enxergarmos caminho estaremos com uma sociedade perdida”,
refletiu.
O ativista social, que há mais de duas décadas atua para
aumentar o empreendedorismo dentro das favelas, propôs ainda a seguinte
reflexão: “Quando estávamos em casa pedindo iFood tinha uma cozinheira
trabalhando, o entregador, a caixa e empacotadora do supermercado, o frentista
no posto de gasolina. O país pararia se não fossem eles. Essas pessoas
mostraram que estavam à disposição quando o país precisou delas”.
Olhar para as particularidades do Brasil é avançar para
geração de empregos
Na avaliação do economista Ricardo Paes de Barros, que foi
um dos formuladores do Bolsa Família, o desenvolvimento social é fundamental
para assegurar direitos da população.
Para que isso ocorra, ela destaca três pilares: transferência de renda,
geração de emprego e inclusão social. “Mas como falar de inclusão sem mencionar
a criação de programas sociais que garantam o acesso ao trabalho, para geração
de renda para as famílias?”, questionou.
Para Paes de Barros, o Brasil deixou de ser modelo de
combate à pobreza quando deixou de seguir o modelo de ‘fila’, de atender quem
mais necessitava de fato. “O programa Brasil Sem Miséria, desenhado em 2011,
que era um modelo mundial de como combater a pobreza, foi substituído por uma
nova lógica que não se aplica a realidade os municípios”, afirmou.
O economista explica que quando passou a existir o auxílio
emergencial, o benefício social deixou de ser centrado em quem mais precisa e,
com isso, aumentou a faixa da pobreza. “Existem vários tipos de pobrezas, que
devem ser desenhados localmente. É preciso União, Estado e municípios
implementarem ações em conjunto, de acordo com a realidade e necessidade de
cada lugar. A partir do momento em que deixamos de monitorar a fila, perdemos a
articulação com os poderes locais que conhecem de fato a comunidade”, analisou.
Segundo Paes de Barros, o desemprego aumentou muito nas
últimas décadas e a indústria tem um papel importante para a retomada e geração
de empregos. Ele pondera, no entanto, que o setor precisa avançar e empregar
mais. “O comércio gera um volume maior de emprego. A inclusão produtiva vem da
tomada de um crescimento sustentável, e esse crescimento precisa vir de um
ambiente melhor. Na verdade, muitos dos novos empregos são gerados por novas
oportunidades”, explicou.
Por fim, o economista alertou que o grande erro brasileiro
em termos de desenvolvimento social é não investir em pessoas. “Em relação ao
Canadá, estamos atrasados em 50 anos em investimento físico e 100 anos em
relação as pessoas. Precisamos investir sabiamente nas pessoas e dar atenção
aos que mais precisam e dar condição. Isso significa investir de forma
adequada, entender o que cada comunidade precisa e usar o dinheiro sabiamente,
numa busca ativa com essa população”, concluiu.
A série 200 Anos de Independência
O primeiro seminário do projeto “200 anos de independência
– A indústria e o futuro do Brasil”, ocorreu em 6 de abril, com o tema Evolução
Política. O segundo debate, realizado em parceria com a Federação das
Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), teve como tema Desenvolvimento
Econômico e Sustentabilidade. Em 11 de maio haverá um debate sobre
Desenvolvimento Industrial, Científico e Tecnológico. O último seminário da
série ocorrerá em 1º de junho, com o tema Educação e Cidadania. Todos os
seminários estão sendo transmitidos ao vivo pelo YouTube da CNI e suas íntegras
podem ser acessadas posteriormente no mesmo canal.
Temas e datas dos próximos debates
11 de maio
Tema: Desenvolvimento Industrial, Científico e Tecnológico
Horário: 10h às 12h
Local: Estúdio da CNI em Brasília
1º de junho
Tema: Educação e Cidadania
Horário: 10h às 12h
Local: Estúdio da CNI em Brasília
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